Um trabalhador honesto é preso durante o momento de lazer com a família e descobre que está condenado por um crime cometido por outra pessoa. A história, que parece roteiro de filme, aconteceu em Salvador e teve um desfecho positivo graças à atuação da Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA). Com uso da prerrogativa de requisição, a instituição provou o equívoco e garantiu que Alex Couto dos Santos, 34, fosse posto em liberdade.
O enredo que levaria o vigilante para a prisão teve início no ano de 2012, quando uma pessoa foi presa em flagrante por roubo e usou o nome de Alex para se identificar no momento da prisão. O acusado não apresentou documento de identificação, não assinou a nota de culpa nem o interrogatório, apenas usou a digital nos documentos. Foi solto no ano seguinte, não compareceu a nenhum dos atos do processo e condenado a cinco anos e quatro meses de reclusão.
Com a condenação, o nome Alex Couto dos Santos foi inserido no Banco Nacional de Mandado de Prisão e o vigilante se tornou uma pessoa apta a ser presa. No dia 1º de julho, quando chegava ao Parque de Exposições, junto ao filho de 14 anos e a esposa, para assistir aos shows da programação de São João, ele foi preso.
“Eu sempre vivi de acordo com o que as leis pedem, por isso nunca imaginei passar por uma situação dessas: ser tratado como um criminoso, passar por todo aquele constrangimento. Durante o período em que estive preso, me perguntava muito o que se passava na cabeça do meu filho”, conta Alex.
Para tentar colocar o rapaz em liberdade, antes de buscar a DPE/BA, um habeas corpus chegou a ser impetrado anteriormente, mas foi extinto por insuficiência de provas. “O habeas corpus, como remédio heróico, precisa estar bem documentado e fundamentado. A prerrogativa das defensorias de requisitar documentos e exames é fundamental para o bom funcionamento do órgão e da própria justiça, pois garante acesso do cidadão aos documentos, exames e certidões necessários à sua defesa e atos da vida civil, em geral”, explica o defensor público e coordenador da Especializada Criminal e de Execução Penal, Pedro Paulo Casali Bahia.
Ao tomar conhecimento da prisão injusta, a Defensoria imediatamente foi à unidade prisional e entrou em contato com Alex, que solicitou intervenção da instituição para sua soltura. De acordo com o defensor público Pedro Casali, ao analisar o processo chamou sua atenção o fato de não ter havido identificação pessoal do homem preso em 2012. “Não houve identificação pela vítima, nem pelos policiais em juizo. Com isso, já havia ali elemento concreto demonstrando que aquela realidade poderia não ser a processualmente adequada, mas seria necessário ainda robustecer o pedido com provas, o que se procurou fazer com a exames e certidões”, conta.
Com uso do poder de requisição, a Defensoria solicitou a perícia das digitais da pessoa que foi presa em flagrante e de Alex. O pedido tinha como objetivo coletar elementos para demonstrar que a pessoa detida não era a que cometeu o delito. “O Departamento de Polícia Técnica foi bastante zeloso e eficiente em produzir a documentação e trouxe à Instituição informação importantíssima para auxiliar a solução da demanda”, avalia Pedro Casali.
O pedido de habeas corpus da DPE/BA foi subsidiado pelo laudo do exame papiloscópico, que concluiu não haver “coincidência nenhuma das impressões digitais apostadas na Ficha de Identificação nominal a Alex Couto dos Santos”; pela confissão do verdadeiro responsável pelo crime que se encontrava detido; e pela contraposição imagem de Alex no registro do Sistema de Administração Penitenciária – SIAPEN 2022 e do registro fotográfico da pessoa detida em 2012.
Perdas e ganhos
A atuação da Defensoria da Bahia garantiu que, no último dia 27, Alex fosse posto em liberdade. Contudo, a prisão injusta rendeu algumas perdas. A principal delas foi uma oportunidade de trabalho para a qual já havia enviado a documentação e feito os exames admissionais. “Eu começaria na segunda-feira, mas não tive como por conta dessa situação que aconteceu comigo e a empresa não podia segurar a vaga”, lamenta.
No pedido de habeas corpus, a DPE/BA também solicita a exclusão total dos dados e toda e qualquer menção e referência ao Alex no processo em que há condenação em seu nome. Com isso, sua ficha criminal retornaria ao status de primário. De acordo com o defensor público Pedro Casali, “a solução final do caso se dará no julgamento da revisão criminal, mas até lá, a não execução desta sentença é ato de justiça e de direito”.