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O POVO NO SUFOCO E LUCRO PARA POUCOS: “REAJA ILHÉUS”

MARCOLINO VIEIRA REIS
Marcolino é é graduando em História pela Universidade Estadual de Santa Cruz, Coordenador na Bahia da União dos Estudantes do Brasil, Membro da Frente Ampla de Estudantes.
Marcolino é graduando em História pela Universidade Estadual de Santa Cruz, coordenador na Bahia da União dos Estudantes do Brasil e membro da Frente Ampla de Estudantes.
Há menos de 20 dias do início da contraditória e polêmica Copa do Mundo, na cidade de Ilhéus é anunciado mais um aumento da tarifa (passagem) do transporte “público” coletivo pela prefeitura municipal, passando a custar mais 20 centavos, pulando do valor de R$ 2,40 para R$ 2,60 e como todo aumento, vem acompanhado de promessas de melhorias.
Mas que melhorias são essas? Seria o passe livre para estudantes, idosos e desempregados? A tarifa zero para todos? Infelizmente não.
A prefeitura anunciou medidas de inovações, requalificando e renovar a frota em 25%, criação de nova linha circular, implantação de bagageiros em veículos que atendem as linhas do interior, criação de duas novas linhas para a (UESC) e Salobrinho, além de espaço para descanso de motoristas e cobradores no terminal urbano. Soma-se a estas medidas a instalação de GPS em 100% da frota de ônibus e implantação de painel, tipo telão, no Terminal Urbano, com informações gerenciais online do sistema de transporte e com finalidade de justificar e legitimar todas essas novas medidas, inclusive o aumento da tarifa para R$ 2,60 o prefeito se utiliza do resultado da auditoria realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), contratada para realização de estudos sobre o sistema de transporte coletivo de Ilhéus. De acordo com essa tal FIPE (que inclusive desconhece a realidade do transporte público nosso de cada dia), as empresas poderão efetuar um reajuste de 20 centavos no valor da tarifa, que passaria de R$ 2,40 para R$ 2,60, a partir do próximo dia 1º de junho e o prefeito completa seu feito dizendo: “Fizemos a consultoria para que houvesse um reajuste justo para todos, já que a empresa solicitou um aumento para R$ 3,19″.
O prefeito também faz questão de informar que sua secretaria do Desenvolvimento Urbano (Sedur) opina também pela tarifa de R$ 2,60 e um despacho da Procuradoria Geral do Município afirmando que a revisão e aumento da tarifa é legal porque está prevista no contrato. Se existe um contrato que garante o aumento da tarifa, por que, por amor à Ilhéus, carinho e respeito aos ilheenses não se revê esse contrato?
Mas me diga você, que diariamente utiliza esse sistema de transporte, que de público só tem nome, se esse aumento de R$ 2,40 para R$ 2,60, mesmo com todas as benfeitorias prometidas, é algo legal pro seu bolso? É importante lembrarmos que não deveria existir um aumento de tarifa, mas sim sua redução, por motivos claros e simples.

Ano passado, em junho de 2013, logo após a onda de protestos e isenção de impostos por parte do governo federal através da Medida Provisória nº 617, de 31 de maio, que zerou as alíquotas da contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para o transporte coletivo municipal rodoviário, várias prefeituras impediram os aumentos e anunciaram a redução das tarifas de transporte público. Algumas delas, como Porto Alegre (RS), João Pessoa (PB), Campinas (SP), Cuiabá (MT), Foz do Iguaçu (PR), Manaus (AM), Paranaguá (PR), Vinhedo (SP) e Valinhos (SP), fizeram o contrário do que a prefeitura de Ilhéus quer realizar este ano. Evitaram o aumento e foram além, reduzindo drasticamente o valor das tarifas em benefício da população. Já nas cidades de Feira de Santana (BA) e Teixeira de Freitas (BA), e até mesmo no estado do Amapá, o avanço foi maior, evitando aumentos e garantindo o passe livre estudantil para os e as estudantes.
Este ano de 2014, ano de Copa, a luta pelo transporte público também não está sendo diferente, aliás, a única diferença são os grandes meios de comunicação (Globo, Record, revistas, rádios, etc) se calando diante de inúmeras manifestações contra a nova tentativa de aumento das tarifas nas cidades brasileiras.
Na cidade de Ilhéus, as ações e manifestações de 2013 impediram o aumento da tarifa, permanecendo o valor atual de R$ 2,40. No entanto, por que diferentemente de quase 60 cidades do país, o preço da tarifa não reduziu como deveria ter ocorrido? Porque ao invés de reduzi-la agora a prefeitura municipal de Ilhéus tenta aumentar a tarifa? Inclusive, descumprindo a Lei Federal 12.587/12, chamada de Política Nacional de Mobilidade Urbana, que estabelece como direito instituído ao usuário do transporte “participar do planejamento, da fiscalização e da avaliação da política local de mobilidade urbana”.
Esse direito nos foi completamente negado.
Para justificar o aumento da tarifa para R$ 2,60, a prefeitura promete inovações, renovações, implantações de novas linhas e até mesmo GPS nos ônibus. Mas qual a real garantia de acesso ao nosso direito à cidade? Porque ela não realiza uma audiência pública para punir as empresas que descumprem os contratos que tem conosco? Ao invés de beneficiá-la com mais lucros à custa do suor dos trabalhadores e estudantes?
Real inovação é a tarifa zero, é o passe livre, ao invés de aumento de tarifa.
Até quando continuaremos sendo transportados pela cidade, feito sardinhas, em pé ou nos degraus? Até quando nós, trabalhadores e estudantes, continuaremos inertes aos mandos e desmandos dos empresários ao descumprimento e insuficiência da nossa demanda? Até quando não teremos linhas descentes e suficientes para os distritos da cidade de Ilhéus? Até quando continuaremos dependentes de um sistema de transporte que apenas beneficia os empresários com lucros e os políticos com financiamentos eleitorais a cada ano de campanha eleitoral como mostrado nos blogs?
Até quando seremos apenas espectadores e quando passaremos a ser protagonistas de nossa liberdade? Que seja agora! Libertemo-nos! Uma cidade só existe para quem pode se movimentar por ela e a única maneira de termos o nosso direito de ir e vir exercido é nós implantarmos através de nossa luta um transporte verdadeiramente público, sem tarifas, sem catracas. As catracas estão em nossa mente, nos impedindo de exercer nosso direito à cidade que pertence a nós, não aos empresários algozes que priorizam o lucro.
A nossa lei orgânica do município de Ilhéus no Art. 269 demonstra claramente a impotência da Câmara de Vereadores quando no § 6º apenas estabelece antes de qualquer aumento das tarifas uma análise e emissão de parecer do legislativo, sem prever uma possibilidade da Câmara, legitimamente eleito pelo povo através do voto direto, poder impedir a vigência desumana de uma tarifa no valor de R$ 2,60. Além também da existência de um Conselho Municipal de Transporte que no Art. 278 apenas fica estabelecido a este (composto por membros do poder executivo, legislativo e sociedade civil organizada), a atribuição de fiscalizador e auxiliador ao invés de ser uma ferramenta deliberativa de impedir o avanço das tarifas.
Devemos ter clareza quanto a discussão do aumento da tarifa ou mesmo da existência dela que as jornadas da juventude em junho do ano passado, mostrou nitidamente por meio da organização, mobilização e demonstrativo de força popular que a tarifa não é uma questão técnica mas sim algo que depende de uma decisão política, uma vontade política dos gestores municipais de aumentar ou diminuí-la ou até mesmo extinguir a única coisa que impede de circularmos pela cidade, de viver a cidade de Ilhéus.
Somente determinado setor é excluído de seu direito de ir e vir. A tarifa, seu aumento ou sua existência é excludente, confina e aprisiona os estudantes e trabalhadores em suas periferias, em seus bairros, impede a utilização das praças públicas, das bibliotecas públicas, da universidade pública. A prefeitura por ser a única em gerir o transporte coletivo, precisa envolver a população em decisões tão importantes como é a decisão do aumento da tarifa que influencia diretamente a vida de cada um onde seu aumento demanda mais recurso para o transporte que deveria ser verdadeiramente público. A prefeitura precisa reconhecer o transporte como direito social, assim como a saúde, a educação, o lazer, já que para acesso a todos esses direitos também necessita-se do serviço público essencial que é o transporte.
Devemos ter consciência portanto de que não somos gado, nem arroz e nem feijão para sermos transportados de qualquer maneira. Apenas alimentando o lucro indiscriminado dos cartéis, monopólios e oligopólios do transporte coletivo.
Ano passado saímos às ruas, mostramos a força do poder popular, impedindo o aumento da tarifa, não podemos e não queremos mais ser reféns do transporte coletivo 365 dias, não queremos o aumento da tarifa para R$ 2,60, devemos dizer nas ruas o que queremos. A democracia como o regime da lei e da ordem é a definição mais pobre de seu conceito. A democracia é em primeiro lugar que considera o conflito social e conflito político, legítimo e necessário não devendo nem ser ocultado nem reprimido mas ser explicitado pelo ofício da própria sociedade. É no conflito que criamos direitos não apenas sociais mas também econômicos, políticos e culturais.
A prefeitura não cumpriu a legislação e não nos convidou para discutir esse aumento de tarifa para R$ 2,60, mesmo sabendo que nossa indignação aumenta a cada giro de catraca, a cada ônibus lotado, a cada linha inexistente, a cada coletivo sucateado e a cada direito negado. A prefeitura precisa entender que não aceitaremos calados, esses aumentos principalmente quando justificado por uma auditoria sem participação popular e que mesmo com a tentativa de desmobilizarmo-nos estabelecendo o aumento a menos de 20 dias da copa da FIFA, transformaremos o nosso sufoco cotidiano não mais em lucro para poucos, mas sim combustível para permanecermos em luta até que o poder popular for respeitado. Ou decidimos nos organizar e lutar pelos nossos direitos ou permaneceremos sendo organizados em função dos que nos oprimem.