Por Carlos Alberto de Lira, Médico Ginecologista & Obstetra; Diretor Técnico do Hospital São José e Maternidade Santa Helena.
Deterioram-se as condições hospitalares ao exercício da medicina e de enfermagem, desestimulando a prática profissional nos hospitais. No contexto, evidenciam-se as possibilidades de atos médicos e de enfermagem inadequados, aumentando infelizmente as estatísticas de erros
Dentro do conceito de hierarquização e regionalização do SUS, constitui a assistência hospitalar a atenção terciária em saúde. Precedem-na a Atenção Primária à Saúde (APS) e a Atenção Secundária ou Atenção Especializada.
A qualidade da prestação de saúde à comunidade pelo SUS está vinculada primordialmente à eficiência do funcionamento da cadeia simples: atenção primária, secundária e terciária.
A adequada integração desse sistema – sem exclusão de nenhum deles – propicia o bem-estar mínimo necessário. Para tanto, necessária se faz a aplicação adequada e em quantitativo justo dos recursos financeiros.
No item Atenção Terciária ou Hospitalar, no quesito específico de assistência materno-infantil em ILHÉUS, deparamo-nos com uma progressiva e inexorável deterioração na qualidade da assistência às gestantes e recém-nascidos, não obstante os esforços das equipes médicas e de enfermagem disponíveis para tanto.
A deficiência notória da assistência pré-natal no município (atenção primária em saúde – APS) sobrecarrega a única maternidade em Ilhéus, transferindo para esta também a missão de prestar assistência em atenção básica, responsabilidade que é dos postos de saúde, se efetivamente estivessem com equipe multiprofissional preparada e instalações funcionando a contento. A cadeia é rompida e a qualidade de assistência à saúde da comunidade é comprometida.
Os parcos recursos que o SUS disponibiliza para as unidades hospitalares, defasados ao longo de 15 anos, estão comprometendo sobremaneira a assistência materno-infantil em nossa cidade, ameaçando em curto prazo o funcionamento da única maternidade em funcionamento: a Maternidade Santa Helena, vinculada ao Hospital São José. Médicos neonatologistas, de cujo labor necessita-se para assistência especializada aos recém-nascidos, estão a se desligar do vínculo hospitalar pelos aviltantes honorários que recebem e escassez de recursos técnicos; médicos obstetras, responsáveis pela coordenação e assistência às gestantes em trabalho de parto, também estão paulatinamente exonerando-se dos plantões sem que a direção do hospital consiga substituí-los. Não há atrativos para esses profissionais. Todavia, diuturnamente responsabilizados por eventuais decessos. O bom exercício da prática médica perpassa pelos honorários adequados, pelas condições de trabalho e material médico condizentes com a responsabilidade de assistir vidas.
Deterioram-se as condições hospitalares ao exercício da medicina e de enfermagem, desestimulando a prática profissional nos hospitais. No contexto, evidenciam-se as possibilidades de atos médicos e de enfermagem inadequados, aumentando infelizmente as estatísticas de erros. URGE a necessidade de reequipar os hospitais, propiciar cursos de reciclagem de seu corpo técnico, reorganizar administrativamente os métodos gerenciais. Ações estas capazes de atrair profissionais para o exercício de uma atenção terciária digna. Em síntese, sem investimentos adequados ― hoje inexistentes pela total ausência de recursos próprios na rede hospitalar ― o caos está à vista.
A assistência materno-infantil na cidade de Ilhéus ― que também atende à microrregião que envolve as cidades circunvizinhas de Una, Canavieiras, Uruçuca, Itacaré, Maraú, etc ― está seriamente comprometida. Esta responsabilidade não pode ater-se tão somente à administração da Santa Casa de Misericórdia de Ilhéus, mantenedora da Maternidade Santa Helena e do Hospital São José. Na gestão plena de saúde em que Ilhéus está inserida, é responsabilidade sobremaneira do município prover meios adequados para corrigir o rumo da assistência materno-infantil. Não com o mero discurso do Projeto Rede Cegonha. Relevante, porém sem resultados imediatos que venham corrigir as deficientes e atuais condições de funcionamento da única maternidade em funcionamento. Estamos inermes, e em decorrência, inertes, não por comodismo, porém desprovidos de recursos financeiros condizentes com a importância da Maternidade Santa Helena no contexto da hierarquização e regionalização que se prever no Sistema Único de Saúde.
Se ações coletivas, envolvendo os órgãos e instituições diretamente vinculados ao contexto assistencial efetivamente não forem estabelecidas, caminharemos para a interrupção no funcionamento de nossa única maternidade. Pagar para ver? Aguardemos os acontecimentos.