A notícia da possibilidade de um tsunami atingir o litoral baiano, causou rebuliço na grande rede, e deixou preocupada a população que reside em alguma localidade situada entre os 1.100 km de extensão da nossa faixa litorânea. A maior do país, valendo ressaltar.
E se a tal onda gigante, causada por uma possível explosão vulcânica nas Ilhas Canárias, litoral africano, atingir de fato a maior faixa litorânea do Nordeste, ou seja a Bahia, estatisticamente, as chances de tal maremoto chegar em Ilhéus – a maior costa do estado – são grandes.
Ficamos imaginando como seria a situação, caso isso acontecesse.
Vindo no embalo, impactante, se destacando entre as marolas que costumam quebrar nas praias ilheenses, o tal tsunami quando chegasse na orla norte, entre o São Miguel e São Domingos, e visse aquele cenário de abandono, concluiria de imediato: “Cheguei atrasado. Não há nada mais ali a ser destruído”. Dito isso, engatou a marcha ré.
Passando pela praia do Malhado, e sentindo o aroma e a textura típicas das suas águas, num mix terrível entre esgoto domiciliar, coliformes fecais, e coisas do gênero, a Onda Gigante também pensou duas vezes. “Não quero que me confundam com qualquer mar de merda desses. Sem falar que, quem é doido de entrar nessa água?”, bradou questionando, antes de sair em busca de outro trecho para despejar sua “fúria tsunamica”.
Parou em frente a praia da Avenida Soares Lopes. Achou perfeita a extensão da faixa de areia. Calculou a destruição possível, e viu aquele imenso local, com belos prédios, em compensação, tomado por mato, com calçamento danificado, sem padronização nenhuma. Uma orla totalmente entregue às traças, e a mercê da permissividade do poder público com a exploração da iniciativa privada no local. Um logradouro que chegou a ser projetado por Burle Marx, e que acabou se transformando num caótico pandemônio urbanístico. Ao constatar tudo isso o tsunami também mudou de ideia e recuou. Mas antes, ligou para o seu primo asteróide: “Cara esse lugar se encaixa perfeitamente com você. Quando puder, dê uma caidinha aqui”. Os nobres e tradicionais moradores da Soares Lopes ao saberem da notícia, emitiram nota de repúdio, compartilhada no Facebook de Zé Nazal.
Passou pelo Morro de Pernambuco, praia do Miache e adjacências, e viu que a desapropriação das casas ali já foi considerada um nada aprazível tsunami do “progresso”, para as muitas famílias obrigadas a deixar o bairro. Acenou para a Dona Ponte, que tremia de medo de sofrer sequelas, e seguiu para os Milionários.
Chegando lá percebeu no local um grande potencial para a destruição oceânica. Respirou fundo, tomou coragem, e partiu decidido a desaguar sua tensão. Foi chegando. Se aproximando. Viu salva vidas trabalhando sem muita estrutura. Ouviu suas queixas. Notou também por ali um vendedor de queijo na brasa reclamando da falta de clientes. Percebeu turistas revoltados com os altos preços nas barracas, e do atendimento horrível. Escutou também a murmuração dos donos de barracas, se queixando contra tudo, desde o baixo movimento, à falta de capacitação do garçom em se virar com um gringo que queria saber como se fala peixe frito em inglês. Consternado, o tsunami mais uma vez acabou desistindo. Melhor, desistiu de Ilhéus em definitivo, para a alegria geral.
“Essa cidade já tem problemas demais”, justificou o tsunami entristecido, antes de pegar seu novo rumo e partir em direção a outros paradeiros. Deus queira, para longe daqui!
Por Rans Spectro para a redação do Ilhéus 24H.