O Ministério da Educação (MEC) mandou nesta segunda-feira, 25, para todas as escolas do País um e-mail pedindo que as crianças sejam perfiladas para cantar o hino nacional e que o momento seja gravado em vídeo e enviado para o governo.
O e-mail pede ainda que seja lida para elas uma carta do ministro Ricardo Vélez Rodríguez, que termina com o slogan do governo “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos.”
“Prezados Diretores, pedimos que, no primeiro dia da volta às aulas, seja lida a carta que segue em anexo nesta mensagem, de autoria do Ministro da Educação, Professor Ricardo Vélez Rodríguez, para professores, alunos e demais funcionários da escola, com todos perfilados diante da bandeira do Brasil (se houver) e que seja executado o hino nacional”, diz o texto.
A carta foi enviada para escolas públicas e particulares do País. “Isso é ilegal, o MEC não tem competência para pedir nada disso às escolas”, diz o diretor da Associação Brasileira de Escolas Particulares (Abepar), Arthur Fonseca Filho.
Diretores de escolas ficaram chocados com conteúdo da carta, principalmente porque pede para que as crianças sejam filmadas. Muitos chegaram a pensar que se tratava de fake news ou vírus em enviado por e-mail.
“Solicita-se, por último, que um representante da escola filme (pode ser com celular) trechos curtos da leitura da carta e da execução do hino nacional. E que, em seguida, envie o arquivo de vídeo (em tamanho menor do que 25 MB) com os dados da escola”, diz o corpo do e-mail. Fonseca Filho disse ainda que as escolas não tem autorização para enviar imagens de seus alunos para o governo.
Anexada, o MEC enviou uma carta assinada pelo ministro, que, segundo a recomendação, deveria ser lida aos estudantes. Na noite desta segunda-feira, o MEC informou que “após o recebimento das gravações, será feita uma seleção das imagens com trechos da leitura da carta por um representante da escola. Antes de qualquer divulgação, será solicitada autorização legal da pessoa filmada ou de seu responsável”.
Ação do ministério pode ir contra direitos, liberdades e lei
O pedido de Velez Rodríguez gerou repercussão entre juristas e educadores, pois iria contra liberdades, direitos e lei.
“A Constituição garante a inviolabilidade da intimidade e da privacidade, e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é ainda mais rigoroso com isso. Por isso, que sempre que é feita uma imagem da criança em alguma atividade escolar, os pais precisam autorizar”, afirmou Luciano Godoy, professor de direito da FGV em entrevista ao G1.
Godoy lembra ainda que a frase “Deus acima de todos” fere a liberdade religiosa, já que o estado é laico.
O presidente da Associação Brasileira de Escolas Particulares, Arthur Fonseca Filho, afirmou ao G1 que: “O ministério não deveria mandar um pedido que soa como uma ordem pedindo que alunos cantem o hino… O mais grave é o pedido de envio da gravação. Isso é ilegal. Não posso mandar imagens dos professores, alunos e funcionários sem sua autorização”.
Outra questão apontada por especialistas foi o uso do slogan da campanha eleitoral de Jair Bolsonaro no documento enviado ao fazer o pedido às escolas.
Carlos Affonso Souza, professor de direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, lembrou que a Constituição determina no Artigo 37 que “a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.