ILHÉUS 24H :: Porque a notícia não para. Porque a notícia não para

NINGUÉM É DEUS

JULIO GOMES

Julio Cezar de Oliveira Gomes é graduado em História e em Direito pela Uesc.
Julio Cezar de Oliveira Gomes é graduado em História e Direito pela Uesc.

Repercutiu amplamente em todo o Brasil o caso ocorrido no Rio de Janeiro, no qual uma agente de trânsito, durante uma blitz, abordou um juiz de direito que dirigia um veículo sem placa, sem documentos e sem portar habilitação, apreendendo o veículo.

Este fato deu origem a um processo judicial em que o Juiz pleiteou indenização por danos morais porque, em determinado momento do diálogo entre ele e a agente, esta afirmou que o condutor do veículo era “juiz, mas não Deus”, o que motivou a condenação da agente ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais.

A atitude do juiz acima citado, infelizmente, não é um caso isolado, mas expressa o pensamento de parte significativa da população que, iludida com seus bens e seu status, ou sem compreender as questões ligadas ao mundo espiritual, acaba por negar o que há de fundamental: Que Deus é Deus, e tudo o mais que existe abaixo Dele está, simplesmente, abaixo Dele.

Durante a maior parte da história da humanidade Deus esteve no cotidiano da vida das pessoas. Não tínhamos antibióticos, nem anti-inflamatórios, nem remédios algum contra a maioria das doenças, e recorríamos a Deus para que nos curasse. Vivíamos na natureza, pedindo a Deus que nos livrasse das feras. Plantávamos ou saíamos para caçar, mas se a natureza se mostrasse adversa não colheríamos nem obteríamos alimento, conhecendo a fome. Tínhamos medo até de “golpe de ar”, que era como os mais velhos denominavam certos tipos de mal estar súbitos que, muitas vezes, ceifavam vidas. E quando nossos amados filhos pereciam ainda na infância – o que ocorria muito, muito frequentemente – dizíamos que se tornaram “anjinhos”, entregando-os a Deus.

Hoje viajamos de avião para outro continente em poucas horas, com a maior segurança. Se o mais humilde entre nós se sofrer um AVC ou infarto, será levado de imediato a um leito hospitalar, onde as chances de sobreviver serão muito grandes. As doenças, em regra, não nos assustam mais, e a fome ainda que existe é fruto da desigualdade e egoísmo humanos, e não do rigor da natureza. Em resumo: achamos que não precisamos mais de Deus!

Terrível engano! Quando os remédios falham, quando ocorre um acidente, quando um ente querido se vai, quando o desespero bate à porta, é a Deus que recorremos, sejamos ricos ou pobres. Na verdade, deveríamos agradecer quando passamos de certos limites e alguém nos adverte de que não somos deuses. Isto evita, inúmeras vezes, males bem maiores.

No caso do juiz teria sido infinitamente melhor que ele acolhesse os argumentos da agente de trânsito, evitando ajuizar uma ação que, após a vitória nos tribunais, lhe deu tão triste fama, expondo-o em cadeia nacional, por todos os meios de comunicação.

Mais do que criticar ao malfadado juiz, talvez caiba a cada um de nós lembrar e aplicar a nós mesmos a afirmação de que não somos deuses. E, quem sabe, nos livramos de ter de compreender isto de forma muitíssimo mais dolorosa.