Sentou-se no banco e deixou sobre a mesa de cimento o envelope. À sua frente, a grande avenida e o prédio em que, na semana anterior, fez os exames. Lembrou-se de ter pensado que o achara familiar, como se já tivesse estado ali, o corredor ao sair do elevador, os cabelos longos e ondulados da atendente, a disposição do balcão e do cesto com as revistas. Lembrou-se também de que o médico sorriu ao lhe estender a mão úmida e fria.
Ficou a olhar para o envelope sobre a mesa, para o seu nome escrito no adesivo branco, uma ou outra formiga a encurtar seu caminho por cima dele – elas carregavam pedaços de folhas e farelos de pão. Não o abriria outra vez. A mulher, o filho, talvez a nora, eles sim leriam o que havia ali dentro, palavra por palavra, e depois o abraçariam cheios de lágrimas nos olhos, a dizer que eram todos uma família e que tudo ficaria bem, que ele não precisaria se preocupar.
Quis gritar, mas a praça estava cheia, pessoas caminhavam pra lá e pra cá, crianças a andar de bicicleta, elas que tinham tanta vida pela frente…
-Porquê?!!! – finalmente disse, baixo, mas forte o suficiente para que Deus pudesse escutar.
Sobre seu braço, uma das formigas encurtava o caminho com uma coisa amarela nas costas. Ele a olhou por um instante, depois esticou o polegar e a esmagou.