Por Jaques Wagner, governador da Bahia pelo PT
A democracia brasileira, no seu atual estágio, merece dos agentes públicos empenho e generosidade. Empenho em fazer prevalecer o diálogo como ferramenta principal de um renovado desenho institucional.
O exame e a análise de um suposto conflito institucional exigem, sempre, elevada dose de prudência e ponderação. A questão da relação entre os Poderes insere-se neste domínio. Postura equilibrada na matéria reconhece a necessidade de oferecer ao Parlamento a possibilidade de uma dinâmica livre e desembaraçada, e, de outra parte, à Suprema Corte, que cumpra sua tarefa constitucional deliberativa na mais absoluta plenitude.
O alcance deste propósito passa por um Congresso Nacional cônscio das suas responsabilidades e coeso na elementar e essencial tarefa de proteger a representação democrática. Idem para Judiciário e Executivo. Mais: todos os Poderes constituídos podem, e devem, interagir para proteger a democracia. O diálogo precisa ser o salto qualitativo. A democracia obriga os Poderes a acolher os argumentos recíprocos.
Nesta direção, o tipo de controle de constitucionalidade é uma questão de ordem prática e política. Não está aprisionado a nenhuma exigência de natureza jurídica ou formal. É assunto afeito ao diálogo democrático entre os Poderes. Tanto é assim que sólidas democracias, como Canadá, Inglaterra, Nova Zelândia e Israel, entre outras, desenvolveram modelos específicos e distintos para o tema.
No sistema brasileiro, se é verdade que é conferida ao Judiciário a primazia no controle de constitucionalidade das normas, a tarefa deve ser também assegurada aos demais Poderes. O exercício prévio do controle de constitucionalidade dos atos legislativos pelo Judiciário, ainda que apoiado em doutrina e jurisprudência, salvo em excepcionalíssimas hipóteses, resulta no risco de subalternizar as prerrogativas do Parlamento.
Por isso, é fundamental que encontremos soluções compartilhadas para aperfeiçoar a interação e o diálogo entre os Poderes da República. Assim, evitaríamos uma “queda de braço” em que todos perdem. E abriríamos espaço para um salutar sistema de freios e contrapesos. Aliás, nossa história recente ilustra, fartamente, uma enorme capacidade de processamento de conflitos sem prejuízo para a normalidade da vida institucional.
A democracia brasileira, no seu atual estágio, merece dos agentes públicos empenho e generosidade. Empenho em fazer prevalecer o diálogo como ferramenta principal de um renovado desenho institucional. Generosidade no sentido de impulsionar o espírito público para a superação de eventuais impasses.
O cenário considerado nesta breve reflexão nada tem de ambicioso ou utópico, na medida em que nossas principais lideranças — no Legislativo, no Executivo, no Judiciário — têm demonstrado o equilíbrio e a parcimônia necessários para o gerenciamento e a resolução de situações de potencial conflito.
As circunstâncias de “estresse” entre Poderes, decorrentes do próprio exercício da democracia, são também oportunidade para o refinamento dos arranjos institucionais. E fonte de aprendizado para uma democracia jovem e dinâmica como a brasileira.