Ao compor a música “Brasileiro”, Waldir Azevedo talvez não imaginasse que poderia influenciar no sabor dos alimentos. Tampouco Eddie Van Hallen presumia que os rifs de guitarra de “Jump” poderiam tornar os sabores “menos apetitosos”. Mas uma dissertação de mestrado da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) afirma que ouvir chorinho ou rock enquanto come tornam os sabores “menos gostosos”. Já a música clássica e a música romântica acentuariam o paladar positivamente, segundo a pesquisa.
“Foi uma grande surpresa. Eu, particularmente, ia torcer pelo sucesso do chorinho”, afirma entre risos o dono do experimento, o músico David Wesley Silva. Ele começou o mestrado com o interesse em testar novas formulações mais saudáveis e que agradassem públicos como o vegetariano e o diabético.
Mas, após sugestão da professora orientadora do projeto, a ideia de misturar música e comida fez com que a pesquisa tomasse outro rumo. “Minha paixão são os dois mundos. Os dois são artes, são ciência, são apaixonantes”, afirma.
RECEITAS E EXPERIMENTAÇÕES – Seis receitas de bombocado, nas quais ingredientes como açúcar, leite, ovo, farinha e linhaça passaram por substituições diferentes, foram provadas por 120 pessoas enquanto escutavam canções de chorinho, rock, música clássica e música romântica. Os degustadores também foram submetidos a testes no silêncio. Ao final, elas deveriam conferir notas ao sabor dos alimentos.
De todas as médias máximas das notas, 43% delas foram dadas sob influência de música clássica e romântica, respectivamente. Já do total de médias mínimas, 33% foram dadas por degustadores enquanto eles ouviam chorinho e 50% enquanto escutavam rock.
Segundo os resultados, a influência da música na qualidade das notas das pessoas foi de 14,4%. “Quanto mais novidade o alimento, maior a influência da música sobre a experimentação. Em cima disso, as notas aumentaram com a música clássica e a música romântica. Já com o rock e chorinho, sempre diminuiu na média”, explica.
Para não influenciar emocionalmente os degustadores, as letras das músicas foram suprimidas e foram selecionadas canções conhecidas e desconhecidas do público. Além disso, elas sempre eram tocadas aleatoriamente, segundo o pesquisador. “Puxamos para nossa terra com o chorinho. A música clássica é um paradigma e já a música romântica e o rock são as mais consumidas atualmente”, afirma.
RITMO ACELERADO – David Wesley utilizou seus conhecimentos de músico formado pela Universidade de São Paulo para analisar o fenômeno. “Eu identifiquei rapidamente a semelhança entre os padrões rítmicos do rock e do chorinho. Como são músicas mais rápidas, o provador pode ser influenciado pelo ‘fator de celeridade’ e comer mais rápido, nem mastigando direito”, explica.
No entanto, o pesquisador afirma que é preciso levar em conta aspectos culturais para os resultados da pesquisa. “É uma coisa que precisa ser investigada melhor. O chorinho, por exemplo, é uma música urbana associada a bares, muito ‘da vida carioca’. Pode ser que os cariocas estejam mais acostumadas e lá seja de outra forma”, afirma.
Wesley já começou o doutorado na Faculdade de Engenharia de alimentos e pretende continuar nos estudos sensoriais relacionados à alimentação. “Estamos pensando já na segunda pesquisa, com outros gêneros como samba, bossa nova e jazz”, afirma ele.