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“BORA” BAHIA

RODRIGO MELO

Rodrigo melo é Catitu, pai de Amaralina, filho de Ilhéus, escritor e fera no pingue-pongue.
Rodrigo melo é Catitu, pai de Amaralina, filho de Ilhéus, escritor e fera no pingue-pongue.

Eu estava no apartamento dos meus sogros, no Leme, Rio de Janeiro, e acabara de voltar da imobiliária onde trabalhava como corretor. O gerente era um sujeito chato e arrogante que vivia a arrotar superioridades. Liguei a tevê e o Bahia vencia o Flamengo por 2 a 1. Maravilha. Só assim me vingo dos arremedos e das piadinhas.

O engraçado é que ninguém é preconceituoso com o Gilberto Gil, fiquei a pensar. Nem com o artista plástico que expõe no MAM. A fama os tornou aceitáveis (não sei se só eu notei, mas o Wagner Moura, ultimamente, anda forçando um sotaquezinho).

Então tem esse coroa burguês que flerta com minha cunhada. Basta me ver que tenta imitar o meu sotaque, sem, claro, conseguir. Antes eu pensava que era brincadeira, mas passei a achar que o seu intuito era outro: colocar-me no meu lugar. Não o culpo, o troço é cultural: tem também a turma do prédio, do trampo e, sobretudo, os clientes, todos cheios de pompa e nariz em pé.

Mas então o Flamengo começou a trocar passes, a envolver o meu amado tricolor (sou Vitória, mas, num caso assim, sou Bahia também), que, sem maldade, se deixou levar. E o rubro-negro carioca, maldoso e mal intencionado, aproximou-se da nossa área como uma serpente, girando a bola dum lado pro outro para, e foi triste a minha surpresa, de repente fazer um gol, um golaço, empatando a porra da partida. E então uma festança aconteceu no prédio em frente, no prédio do lado, nos apartamentos em cima e embaixo do meu, no meio da rua e, pelo visto, no mundo inteiro. Gritos, pulos, foguetório. Parecia carnaval. Enquanto eu tentava me refazer, veio o duro golpe: os caras emendaram mais um gol, e nem deu para ver direito como foi.

Merda, merda e merda.

O foguetório triplicou, gritos e sorrisos. Aquilo era demais. O Bahia vai ser rebaixado novamente? O que é que eu vou dizer lá na corretora amanhã? Lembrei da cara do meu chefe, que era vascaíno, mas, em casos assim, bem poderia ser flamenguista também, e não gostei das coisas que o imaginei falar. Será que esses chatos têm razão ao nos diminuírem? Era possível que sim, naquele instante. A prepotência é a arma de quem quase sempre acha que tem razão.

Entretanto, quando eu me levantava do sofá, quando a esperança ia pra cucuia, como se diz, o meu Bahia, glorioso e incansável, tirou o seu coelho da cartola e meteu um golaço no fundo da rede dos caricas. Nem vi direito como foi, mas deve ter sido assim, um golaço. Jobson, logo ele, tão criticado.

Fui até a janela, escancarei-a e gritei, com toda raiva, revanchismo e também felicidade que tinha no coração:

– Bora Baêêêêêa minha porra!!!!!!!!

Não lembro de quantas pessoas me xingaram, de quantas mostraram o dedo do meio ou ameaçaram me matar, mas foram muitas. No apartamento de frente pro nosso, do outro lado da rua, três sujeitos e uma senhora quase saltaram no ar para me esganar.

– Baiano fdp, viado, – eles gritavam – raça de gente preguiçosa, vem aqui pra se fuder!!!

A velha era quem mais tinha raiva. Cuspia ao gritar. Senti medo. Aliás, senti pavor. Talvez nem Gil, muito menos o cara que expõe no MAM, tivesse alguma chance com ela. Não duvido que o Wagner Moura fosse linchado também, caso vacilasse em alguma palavrinha.

Fechei a janela, desliguei a tv. Às vezes é melhor empatar.