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50 ANOS DE 31 DE MARÇO DE 1964 E O BRASIL DE HOJE

Julio Cezar de Oliveira Gomes, professor de história e graduado em direito

Julio Cezar de Oliveira Gomes é professor, graduado em História; e advogado, graduado em Direito, ambos pela UESC .

Entretanto, o que há de novo neste aniversário de 31 de março de 1964 não é a comemoração dos militares, que sempre a fizeram, de forma mais ou menos ostensiva, mas um clamor pela volta dos militares ao poder, que ecoou fortemente por todos os meios de comunicação.

Para uns, golpe. Para outros, revolução. O fato é que há cinquenta anos um movimento militar arrancou o Presidente João Goulart do Palácio do Planalto e impôs àquele Brasil um governo composto por uma estranha junta militar.
O resto da história, já se sabe. O regime de exceção se impôs pela força das armas e da máquina governamental por vinte e cinco longos anos, até que sob a pressão da imensa maioria dos brasileiros pelo fim da Ditadura, foi eleito, de forma indireta, um presidente civil, em 1985; e depois promulgada a Constituição de 1988, pondo fim ao Período Militar.
Entretanto, o que há de novo neste aniversário de 31 de março de 1964 não é a comemoração dos militares, que sempre a fizeram, de forma mais ou menos ostensiva, mas um clamor pela volta dos militares ao poder, que ecoou fortemente por todos os meios de comunicação.
Causa estranheza que em um Brasil muito mais desenvolvido economicamente, muito mais escolarizado e com chances de ascensão social infinitamente maior do que as que existiam na década de 1960, 70 e 80, este clamor tenha sido ouvido. Mas foi.

Penso mesmo que, se o povo não aderiu ao apelo do retorno à Ditadura, foi justamente por esta compreensão de que a vida melhorou, e muito.
Porém, o mesmo povo que se recusou a aderir à Marcha da Família também se recusa a defender o regime democrático, em uma clara demonstração de desprestígio da democracia junto àqueles que mais deveriam defendê-la: o povo.
Observo, especialmente, que o discurso de que a Ditadura assassinou cruelmente seus opositores – e assassinou de fato – não comove mais às pessoas. Por que será?
Façamos uma análise. Segundo organizações que têm afinidade com os mortos e desaparecidos da ditadura, estes somaram 379 pessoas ao longo de 25 anos (fonte: http://www.desaparecidospoliticos.org.br/pessoas.php?m=3). A relação oficial, admitida pelo Governo, registra 357 mortos; e os familiares dos desaparecidos falam em 426 pessoas (fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/58032-lista-oficial-de-mortos-pela-ditadura-pode-ser-ampliada.shtml).
Agora voltemos ao Brasil de hoje.
De acordo com fontes conceituadas como a inglesa BBC, que baseia seus números em dados oficiais, do Governo Federal “Segundo essas mesmas estatísticas (feitas a partir de dados do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde), ocorreram, em 2010, quase 50 mil assassinatos no país, com um ritmo de 137 homicídios diários” (fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/12/111214_mapaviolencia_pai.shtml).
Assim, com 137 homicídios diários, em apenas três dias e algumas horas a violência urbana, cotidiana e ligada ao crime comum de hoje assassina mais pessoas do que a Ditadura matou ao longo de 25 anos!
Senhoras e senhores: Com 50 mil mortos por ano não pode haver como prestigiar a democracia, porque com tal número de homicídios simplesmente não há democracia. Há qualquer outra coisa. Menos democracia.
Neste aniversário de 50 anos do 31 de março de 1964, não quero atiçar revanchismos, nem retirar aos militares a responsabilidade sobre os crimes que tenham cometido. Quero apenas dizer que há um Brasil que chora, cotidianamente, por um dilúvio de sangue que jorra das capitais e do interior deste país. Sangue de jovens, de negros, de brancos, de mulheres, de pessoas pobres e de classe média, de crianças, de idosos, enfim, de seres humanos.
Gostaria, imensamente, que parássemos um pouco de nos preocuparmos com os 357 mortos da ditadura, que não poderemos mais salvar, e que passássemos a nos preocupar com os mesmos 357 que perdemos a cada três dias. Aqueles pelo menos conseguiram entrar para a história do Brasil, defendendo seus ideais.
Quanto a estes, só consigo pensar, todos os dias, que é nossa obrigação fazer alguma coisa para tentar salvá-los. Antes que, em três dias, os percamos de novo.