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OPINIÃO: NA INDICAÇÃO AO STF, LULA PODERIA AJUDAR A FAZER HISTÓRIA, MAS DECIDIU SER APENAS MAIS UM

Nesta segunda-feira (27), antes de sua partida para a COP28 em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) oficializou as indicações ao Supremo Tribunal Federal (STF). Flávio Dino (PSB), atual ministro da Justiça, e Paulo Gonet, escolhido para a Procuradoria-Geral da República, são os nomes selecionados.

As decisões foram tomadas em reunião no domingo, 26, entre Lula e membros do governo. A expectativa é que as indicações sejam aprovadas pelo Senado antes do recesso parlamentar, em 23 de dezembro. Os indicados serão submetidos à sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e passarão pelo crivo dos senadores.

Flávio Dino, caso aprovado, ocupará a vaga deixada pela ministra Rosa Weber no STF, garantindo um mandato de 20 anos na Corte Suprema.

No entanto, a ausência de uma jurista negra entre os indicados para ocupar a vaga deixada pela aposentadoria da ex-ministra Rosa Weber levanta questões cruciais sobre representatividade e diversidade no judiciário.

O professor de Filosofia do Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Philippe Oliveira, trouxe a pauta durante uma audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) no Dia da Consciência Negra. Oliveira destacou a ausência histórica de uma mulher negra no STF em seus 132 anos de existência e defendeu que a indicação de uma magistrada ou jurista negra seria um passo fundamental para combater o racismo estrutural no Brasil.

A defesa por representatividade e justiça racial foi ecoada pelo presidente da CDH, senador Paulo Paim, que expressou seu desejo de ver uma mulher negra no STF. No entanto, Paim ressaltou que, apesar de conhecer Lula há muitas décadas, respeita o processo decisório do presidente, indicando que o momento para essa representatividade ainda não chegou, mas, segundo ele, certamente chegará.

Lívia Sant’Anna Vaz, promotora de Justiça na Bahia, alertou para o descumprimento do Brasil em relação à Convenção Interamericana contra o Racismo, destacando a obrigação do país de promover diversidade racial na representação jurídico-política. Sant’Anna Vaz ressaltou a necessidade de superar o estado inconstitucional de coisas para alcançar essa diversidade nos espaços jurídicos e políticos, que são fundamentais para transformações sociais.

Vera Lúcia Santana, coordenadora da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), trouxe à tona a relação dramática do Estado com a população negra, especialmente nas ações policiais. Referindo-se a dados alarmantes de uma pesquisa recente, ela enfatizou que o Estado brasileiro está longe de se constituir numa nação quando, de maneira predominante, age para negar direitos, especialmente às comunidades negras.

Durante a audiência, Paim celebrou avanços legislativos, como as renovações de cotas sociais e raciais para universidades, considerando-os um passo positivo no combate ao racismo estrutural. No entanto, esses avanços coexistem com a realidade crua dos dados que revelam a morte desproporcional de pessoas negras em ações policiais.

Conversei com Marta de Melo Lisboa, pedagoga, advogada, especialista em Direito Previdenciário, e mestranda em Direito e Sociedade pela UFSB. Além de sua atuação profissional, Marta desempenha papéis importantes, como a Vice-Presidente da UNEGRO Ilhéus e Presidente da Comissão da Promoção da Igualdade Racial da OAB Ilhéus. Sua visão como advogada e jurista negra acrescenta uma dimensão crítica ao contexto da indicação para o STF.

Na análise de Marta, a indicação de uma mulher negra para o Supremo Tribunal Federal é crucial, considerando o contexto histórico do Brasil e a luta antirracista. “Infelizmente, os jogos políticos ainda estão limitados ao patriarcal estrutural que vivemos. Penso que a indicação de Flávio Dino não agrada só ao partido dos trabalhadores que anseia por um nome mais ligado à esquerda, bem como deixa claro como a diversidade de gênero e raça ainda não é um comprometimento no âmbito político e judiciário brasileiro.” Concluiu a jurista.

Este momento não apenas ressalta a importância de debates sobre inclusão e diversidade, mas também instiga a sociedade a questionar profundamente as motivações por trás das escolhas políticas e a exigir ações efetivas em direção a um Brasil mais igualitário e representativo.

Artigo de Pedro Afonso, graduando em Comunicação Social pela UESC.